{Resenha} O Sol Também é Uma Estrela — Nicola Yoon
Sinopse: Natasha: sou uma garota que acredita na ciência e nos fatos. Não acredito na sorte. Nem no destino. Muito menos em sonhos que nunca se tornarão realidade. Não sou o tipo de garota que se apaixona perdidamente por um garoto bonito que encontra numa rua movimentada de Nova York. Não quando minha família está a 12 horas de ser deportada para a Jamaica. Apaixonar-me por ele não pode ser a minha história. Daniel: sou um bom filho e um bom aluno. Sempre estive à altura das grandes expectativas dos meus pais. Nunca me permiti ser o poeta. Nem o sonhador. Mas, quando a vi, esqueci de tudo isso. Há alguma coisa em Natasha que me faz pensar que o destino tem algo extraordinário reservado para nós dois. Universo: cada momento de nossas vidas nos trouxe a este instante único. Há um milhão de futuros diante de nós. Qual deles se tornará realidade?
“O vocalista do Nirvana era o Kurt Cobain. Sua voz, a corrosão que existe nela, o modo como não é perfeita, o modo como a gente sente tudo que ele já sentiu, o jeito como a voz se estica tão esgarçada que parece que ela vai se romper e não se rompe, foi a única coisa que me manteve sã desde o início deste pesadelo. Seu sofrimento é muito mais desesperançado do que o meu”. (p. 14.)
“Secretamente, no fundo do coração, quase todo mundo acredita que existe algum sentido, alguma objetividade na vida. Justiça. Coisas boas acontecem com pessoas boas. Coisas ruins acontecem com pessoas ruins. Ninguém quer acreditar que a vida é aleatória […]. É melhor ver a vida como ela é, e não como a gente quer que seja. As coisas não acontecem por algum motivo. Simplesmente acontecem” (p.34).
Outro tema que Yoon aborda é a mescla entre etnias. A inclusão de uma protagonista mulher e negra aparece mais uma vez em seu estilo: Tudo e Todas as Coisas segue esse padrão da garota negra e do garoto sonhador de cabelos longos. Em O Sol Também é Uma Estrela também temos a inclusão de costumes coreanos, onde se faz bem presente toda a história da imigração coreana nos Estados Unidos, o que abrange a vida e a família de Daniel. O preconceito é outro fator que predomina no contexto da família dele – o fato de ele namorar uma garota negra, que ainda por cima assume seu cabelo crespo, é um absurdo, o ideal seria namorar uma garota coreana. Yoon ajuda a quebrar todas essas barreiras com o casal protagonista, que tem uma leveza sublime ao se deparar com esses assuntos, tão banais perto do que sentem um pelo outro.
“Nós temos cérebros grandes e lindos. Inventamos coisas que voam. Voam. Escrevemos poesia. […] Somos capazes de grandes vidas. De uma grande história. Por que aceitar menos? Por que escolher a coisa mais prática, a coisa corriqueira? Nós nascemos para sonhar e fazer as coisas com as quais sonhamos” (p. 85).
O Sol Também é Uma Estrela, como muitos podem prever pelo que foi dito até agora, é daqueles livros que te iludem até dizer chega. Dificilmente iremos nos deparar com o amor de nossas vidas no meio da rua, nos apaixonar perdidamente e ter um dia lindo ao lado dela. Se isso já aconteceu para você, comente sobre, por favor. O fato é que apesar de diversos choques de realidade que a história traz em si, é difícil imaginar como duas pessoas podem se apaixonar perdidamente em um só dia e como conseguiram se conhecer tão bem ao longo de poucas horas. Essas são coisas inexplicáveis que me fizeram balancear um pouco durante a leitura e quase chegar a conclusão que o romance entre os protagonistas não era convincente o suficiente. Mas a mensagem vai muito além de toda essa fantasia, e ela não é difícil de ser captada, por isso coisas tão impossíveis assim são tomadas como reais na mente de um leitor totalmente envolvido.
A capa é uma obra de arte literal. Não é computação gráfica: a designer australiana Dominique Falla trabalha com tipografias táteis tridimensionais – confira aqui seus maravilhosos trabalhos. Ela tem uma série de obras em que utiliza apenas pregos e linhas coloridas como instrumentos de criação. O Sol Também é Uma Estrela fez parte dessa série. Veja aqui o vídeo com a construção da capa. Ela traduz exatamente a mensagem que o livro passa, ou seja, a conexão que há entre todas as pessoas do mundo para que ao menos duas delas se encontrem e se apaixonem – isso remete aos vários acontecimentos que se passaram ao longo do dia (e da vida) de Natasha e Daniel para que os dois se encontrassem. A diagramação é impecável, cada capítulo tem o símbolo que representa cada personagem e a cartela de tatuagens adesivas com os símbolos foi um mimo muito fofo, assim como a almofadinha com uma das belas citações do livro.
Não se trata apenas de uma história de duas pessoas apaixonadas. Se trata também das coisas que o Universo precisou fazer para que todos chegássemos ao hic et nunc (aqui e agora), e dos sonhos que é preciso ter para fazer nosso mundinho particular girar no sentido correto, mesmo quando muita coisa não faz sentido. O Sol Também é Uma Estrela é um livro intenso, que mexe com os sentimentos sem dó e é capaz de afetar diversas visões de mundo. O quanto nossas vidas podem mudar em apenas um segundo? – esse é o questionamento que predomina durante todo o enredo. E a resposta é: a escolha é sua.
Primeiro parágrafo: “Carl Sagan afirmou que, se você quiser fazer uma torta de maçã desde o início, precisa primeiro inventar o Universo. Quando ele afirma “desde o início”, quer dizer a partir do nada. Quer dizer a partir de um tempo anterior à existência do mundo. Se você quiser fazer uma torta de maçã a partir do nada, precisa começar com o Big Bang, universos em expansão, nêutrons, íons, átomos, buracos negros, sóis, luas, marés oceânicas, Via Láctea, Terra, evolução, dinossauros, eventos de extinção, ornitorrincos, Homo Erectus, homem de Cro-Magnon, etc. Precisa começar do início. Precisa inventar o fogo. Precisa de água, solo fértil e sementes. Precisa de vacas, pessoas para ordenhá-las e mais pessoas para bater esse leite até virar manteiga. Precisa de trigo, cana-de-açúcar e macieiras. Precisa de química e biologia. Para uma torta de maçã realmente boa, precisa das artes. Para que uma torta de maçã dure gerações, precisa da prensa gráfica e da Revolução Industrial e talvez até de um poema”.
Melhor quote: “Acho que todas as nossas partes boas estão conectadas em algum nível. A parte que divide com outra pessoa o último biscoito de chocolate do pacote, que faz doação para uma instituição de caridade, que dá um dólar para um músico de rua, que trabalha como voluntária, que chora com os comerciais da Apple, que diz eu te amo ou eu te perdoo. Acho que isso é Deus. Deus é a conexão com a melhor parte de nós”.