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{Resenha} Objetos Cortantes — Gillian Flynn

Livro: Objetos Cortantes

Título original: Sharp Objects
Autor (a): Gillian Flynn
Editora: Intrínseca
Páginas: 256
   ISBN-13: 9788580576580

Sinopse: Uma narrativa tensa e cheia de reviravoltas. Um livro viciante, assombroso e inesquecível. Recém-saída de um hospital psiquiátrico, onde foi internada para tratar a tendência à automutilação que deixou seu corpo todo marcado, a repórter de um jornal sem prestígio em Chicago, Camille Preaker, tem um novo desafio pela frente. Frank Curry, o editor-chefe da publicação, pede que ela retorne à cidade onde nasceu para cobrir o caso de uma menina assassinada e outra misteriosamente desaparecida. Desde que deixou a pequena Wind Gap, no Missouri, oito anos antes, Camille quase não falou com a mãe neurótica, o padrasto e a meia-irmã, praticamente uma desconhecida. Mas, sem recursos para se hospedar na cidade, é obrigada a ficar na casa da família e lidar com todas as reminiscências de seu passado. Entrevistando velhos conhecidos e recém-chegados a fim de aprofundar as investigações e elaborar sua matéria, a jornalista relembra a infância e a adolescência conturbadas e aos poucos desvenda os segredos de sua família, quase tão macabros quanto as cicatrizes sob suas roupas.

  
Gillian Flynn é muito famosa por escrever obras de teor psicológico. Já publicado no Brasil e adaptado para o cinema, o livro “Garota Exemplar” foi o grande sucesso da autora, contribuindo para que também houvesse uma proposta de adaptação para “Objetos Cortantes”, uma obra que trabalha muito com problemas familiares e autoflagelação. “Objetos Cortantes” já foi publicado anteriormente no Brasil pela Editora Rocco, com o título de “Na própria Carne”, mas teve seus direitos revertidos para a Editora Intrínseca. Confira a resenha a seguir: 
     Camille Preaker tem pavor de sua infância e adolescência. Acontecimentos misteriosos ligados a sua irmã falecida, Amma, a fazem, até hoje, enlouquecer. Uma forma que encontrou de se abdicar dessa dor foi se afastar da sua família – sua mãe neurótica, seu padrasto e sua meia-irmã – para ser jornalista em Chicago.
     Entretanto, seu editor a manda novamente para sua cidade natal, Wind Gap, a fim de que ela faça uma extensa e promissora matéria sobre as duas crianças vítimas de um possível serial killer. Wind Gap, uma cidade extremamente pequena, está apavorada com esses homicídios tão incomuns e buscam manter as crianças trancadas em casa. 
     Para isso, Camille terá que se hospedar na casa de sua mãe e enfrentar as memórias que tanto a assombrava, e, pior, enfrentar uma sociedade tradicional, isolada e recatada – nada hospitaleira. Foi durante esses dias de grande dificuldade na obtenção de testemunhos que Camille mergulhou de cabeça na investigação dos casos tão semelhantes entre si. O assassino raptara duas crianças de personalidades idênticas e as asfixiara até que morressem, para então, arrancar todos seus dentes. 
     Havia algo na maneira como as crianças foram escolhidas e mortas que deixava Camille obcecada. Ela faria de tudo para solucionar o caso e terminar a sua matéria. 

“Uma
criança criada com veneno considera dor um consolo”

     Gillian Flynn merece a fama que tem. Sua narração em primeira pessoa foi intensa, concreta e tão bem contextualizada, que se tornou impossível largar esse livro perturbador e viciante desde o começo da leitura. 
     Trata-se de uma narração simples no aspecto da linguagem e do vocabulário, contudo, extremamente enfeitada com pontuações, e impactante com palavras sozinhas, levando o leitor a refletir. Mais que isso, a autora nos apresenta metáforas realmente desconcertantes, que nos leva a saber muito sobre a personalidade e mentalidade de Camille, nossa protagonista tão complexa.
     Camille é uma das personagens mais peculiares e instáveis que já conheci – muito similar com as pessoas que integram nossa realidade. A protagonista tem vícios, tem pensamentos que são fora do comum, e dá dicas, constantemente, de seus problemas psicológicos e emocionais. Foi inteiramente interessante lidar com uma personagem assim, tão verdadeira e tão palpável, cheia de traumas e dores. 
     Já os demais personagens são tão concretos quanto Camille. A mãe dela, Adora, instigou minha curiosidade assim que se tornou presente no enredo, e tratei de prestar a devida atenção nos personagens mais passageiros, mas, ainda sim, suspeitos. 
     Esse é o ponto mais forte das tramas de Gillian Flyn: o relacionamento dos seus personagens. Já havia lido vários livros semelhantes, de vários autores igualmente famosos, com enredos mais que surpreendentes, entretanto, nenhum deles trabalhava as “pessoas” envolvidas do modo como Gillian faz. Ela lida com o psicológico dos personagens – e, pasme: com o psicológico do próprio leitor – com uma naturalidade e talento incríveis. Fico imaginando quanto tempo demorou para que sua história fosse tão detalhadamente real em sua mente, para só então, construir um livro tão profundo e intenso.
     Cheio de mistérios, “Objetos Cortantes” tem um suspense arrebatador. Aos poucos, algumas lembranças e informações – muitas delas achamos até desnecessárias, mas não são – acabam sendo liberadas propositalmente para o leitor se situar e formular suas próprias teorias. Essas lacunas abertas acabaram sendo totalmente fechadas no final, não resultando em furos ou qualquer outro pecado cometido pela autora.

 “Eu sentia as lagrimas represadas, como um
balão de água cheio prestes a explodir. Suplicando por um furo de alfinete.
Wind Gap era tóxica para mim. Aquela casa era tóxica para mim.”

     Acredito que esse clima sombrio e esses personagens um tanto doentios podem instigar a curiosidade do público. Foram por essas características que eu permaneci tão submersa na leitura, além de eu ter apreciado os temas abordados, tão difíceis de se desenvolver. Gillian Flynn tratou de problemas familiares, criticou a sociedade tradicional patriarcal – demasiadamente machista – e desenvolveu sua ideia em cima da automutilação. Foram assuntos bem diferentes dos quais eu já tive contanto, só aumentando meu interesse pela obra.
     O clímax do livro foi perfeito, assim como o seu desfecho, que foi mais que impactante. Sabe quando você fecha um livro e relembra tudo de especial que leu? Com Objetos Cortantes foi assim. A autora criou um final pesado e marcante. 
     Contudo, apesar de ter sido uma conclusão extremamente válida e satisfatória, não foi algo totalmente surpreendente. Gillian não pareceu querer esconder de fato a resolução de seu mistério e sim, manter o charme da sua trama nos personagens e na dinâmica dos fatos. Em nenhum momento Objetos Cortantes perdeu a graça por ter tido um desfecho imaginável. O objetivo e a mensagem principal da autora não estavam nessa parte da obra. 
     A Editora Intrínseca está de parabéns pela edição, que conta com uma capa simples, porém, bem arquitetada, uma fonte de letra satisfatória e contributiva, páginas suficientemente amareladas e uma tradução e revisão impecável. 
     Indico muito essa leitura para todos que apreciam um romance policial mais perturbador, sombrio e viciante. Gillian despertou minha curiosidade para suas demais obras e despertou meu gosto por livros de teor psicológico. Vale cada centavo!

Primeiro Parágrafo:
“Meu suéter era novo, vermelho-berrante
e feio. Eram doze de maio, mas a temperatura caíra para a casa dos cinco graus,
e, após cinco dias tremendo sem agasalho, arrumei um em uma liquidação em vez
de vasculhar minhas roupas de inverno encaixotadas. Primavera em Chicago.”

Melhor Quote: “Gostaria de poder dizer que sinto pena dele, mas temo que
nunca mais conseguirei sentir pena novamente.”

  


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