{Resenha} Reportagens — Joe Sacco
Sinopse: Na última década, Joe Sacco tem se voltado cada vez mais aos quadrinhos curtos para nos mandar seus relatos dos conflitos ao redor do globo. Reunidas pela primeira vez, essas reportagens mostram por que Sacco é um dos principais correspondentes de guerra dos nossos tempos. São histórias de refugiados africanos em Malta, de contrabandistas palestinos, de criminosos de guerra e de suas vítimas. E ainda de uma incursão com o exército americano no Iraque, em que ele vê de perto a miséria e o absurdo da guerra. Um de seus trabalhos mais maduros, Reportagens traz sacco nas linhas de frente dos conflitos, relatando com sensibilidade e crueza os horrores — e as esperanças — da humanidade.
“O equilíbrio não devia acobertar a preguiça. Caso haja duas ou mais versões dos fatos, o jornalista precisa não só explorar e avaliar cada declaração, mas também ir a fundo no relato contestado independente de quem o relata. Por mais que o jornalismo seja “O que eles disseram que viram”, ele também é “O que eu vi”. O jornalista deve empenhar-se em descobrir o que acontece e relatar, e não tornar a verdade neutra só porque houve distribuição totalitária de espaço” (p. 6).
A proposta de um livro que une jornalismo e quadrinhos me pareceu atraente logo de cara, pois trata-se de algo a que nunca tive acesso antes e por isso a curiosidade me trouxe Reportagens — será que a proposta é tão boa quanto parece? Joe Sacco é um nome famoso no jornalismo americano. O correspondente de guerra já publicou seus trabalhos em vários veículos de comunicação importantes para a informação de massa, mas também não sabia muito sobre como esse trabalho funcionava, e este livro foi, se dúvida alguma, uma maravilhosa oportunidade.
A escrita de Sacco não perdeu seu caráter jornalístico, apenas foi apresentada em outro formato. As falas diretas tomaram seu espaço como balões de diálogo sobre os entrevistados representados pelo desenho. As falas indiretas e a narração/exposição dos fatos ocorrem nos balões narrativos. O formato do texto é contido, já que não se trata de apenas mais uma história fictícia dos quadrinhos. Por lidar com relatos verídicos, o formato é mais sério e brando, não se utilizando de muitos recursos como se costuma ver nas comics. Alguns quadrinhos se apresentam coloridos, outros em preto e branco.
A narrativa de Sacco é carregada de sarcasmo — ele visa a objetividade, mas não deixa escapar uma boa oportunidade de satirizar a situação contra os poderosos. Apesar de claramente tomar uma posição — ele deixa bem claro em sua introdução que está ali para dar voz aos que não são ouvidos —, o repórter mostrou diversos lados da situação. Na história “Complacência Mata”, ele toma os militares como personagens e mostra suas versões dos fatos. Muitos o criticaram e sua resposta evidenciou que seu compromisso é sempre com a verdade.
Outro detalhe que ele acrescenta na consideração da citação acima é que qualquer jornalista, inclusive ele próprio, faz toda a diferença no transcorrer dos fatos. Ou seja, a presença de um jornalista será determinante para moldar as mais diversas ocorrências. Este pensamento do autor se faz tão presente que ele se auto-retrata nos desenhos, mostrando como chegou até os entrevistados, como se posicionou no local, etc., tudo com o uso de diferentes pontos de vista nos panoramas dos quadrinhos. Isso tira a impressão que a figura do repórter é o de uma mosquinha que apenas observa o que está à sua volta como um ser onipresente.
“Passamos anos assistindo à matança da nossa sala de estar e, agora que acabou, vestimos toga e finalmente resolvemos dar um jeito. Dizer o que é genocídio depois de ocorrido é muito mais fácil do que impedir. Como me disse o advogado bósnio Saih Karabdic: Alguém deu a ordem, alguém executou e alguém permitiu. E todos são culpados” (p. 13).
Primeiro parágrafo: “Este volume reúne a maior parte das reportagens de menor extensão que fiz nos últimos anos para revistas, jornais e antalogias. Sendo assim, me parece que ele exige algum tipo de saraivada introdutória para achacar todos aqueles que se opõem à legitimidade dos quadrinhos como forma eficiente de fazer jornalismo”.
Melhor quote: “Tenho interesse sobretudo por aqueles que raramente são ouvidos, e não creio que caiba a mim equilibrar suas vozes com as apologias bem escovadas dos que detêm o poder. Os poderosos geralmente estão muito bem servidos pela mídia massiva ou pelos órgãos de propaganda ideológica. Os poderosos têm de ser citados, é claro, mas para que seus pronunciamentos possam ser avaliados diante da verdade, não para obscurecê-la”.